I SEMANA DE LUTAS DA FEDERAÇÃO NACIONAL DE ESTUDANTES DE DIREITO

I SEMANA DE LUTAS DA FEDERAÇÃO NACIONAL DE ESTUDANTES DE DIREITO


i)                    Apresentação;
ii)                  Eixos de luta e método sugerido.



(i)                 Apresentação

{...}
não me serve tão fria
a ousadia

sim me serve a vida
que é vida até morrer-se
o coração alerta
sim me serve

me serve quando avança
a confiança

me serve teu olhar
que é generoso e firme
e teu silêncio franco
sim me serve

me serve a medida
de tua vida

me serve teu futuro
que é um presente livre
e tua luta de sempre
sim me serve

me serve tua batalha
sem medalha

me serve a modéstia
de teu orgulho possível
e tua mão segura
sim me serve

me serve teu caminho,
companheiro.

(Trecho do poema “me sirve y no me sirve”, de Mário Benedetti)



É na congregação de esforços, na concentração e na organização que nossos sonhos e bandeiras se encaminham.

No afã de incrementar o protagonismo da Federação Nacional de Estudantes de Direito (FENED), expandir e integrar suas pautas, e dar cumprimento ao encaminhamento tirado na Plenária Final do ENED 2010, que trazia a necessidade da criação de uma Semana de Lutas da Federação, e após intenso debate realizado no I Curso de Formação Política e no Conselho Nacional de Entidades Representativas de Estudantes de Direito (CONERED), ocorridos em Aracaju/SE, a Coordenação Nacional de Estudantes de Direito (CONED) vem divulgar o presente informativo acerca da Semana de Lutas, com vistas à dinamização da referida atividade e sua construção pela base da Federação.

Há alguns anos, a Federação tem-se resumido à realização de encontros regionais e nacionais. Anualmente, milhares de estudantes de Direito se encontram em determinada universidade, ocasião em que debatem, horizontalmente, diversos temas, a partir deles tomando posição e organizando ações, em plenária final, acerca dos diálogos ocorridos.

Tais espaços, ainda que com dinâmica, integração e debates intensos e necessários, deixam a desejar pela impossibilidade da presença deveras massiva dos estudantes de Direito, seja por questões financeiras, seja por questões de tempo. Outrossim, por vezes tais eventos acabam se tornando exclusivos na agenda do Movimento Estudantil de Direito, sendo um fim em si, reduzindo o potencial de tensão da classe estudantil.

É necessário, portanto, avançar.

Os novos passos a que a Federação se propõe a trilhar buscam levar os debates ocorridos nos encontros nacionais e nos conselhos de entidades para as faculdades, tornando-os cotidianos não apenas aos militantes da Federação, mas também aos estudantes que não se organizam em centros ou diretórios acadêmicos.

Esse saber-cotidiano não surge apenas por uma questão de publicidade das posições nacionais dos estudantes de Direito. Muito antes, tem por intenção oportunizar a organização daqueles para a intervenção no Movimento Estudantil de área, na universidade e na sociedade.

Por questões prático-financeiras, é impossível à Coordenação Nacional se fazer presente em todas as faculdades, restando aos militantes da Federação, organizados em Centros e Diretórios Acadêmicos ou em coletivos locais, a responsabilidade pela coordenação dos espaços circunscritos a Semana de Lutas nas suas localidades.

Tal responsabilidade, contudo, não deriva apenas de impossibilidade de atuação da CONED localmente. Pelo contrário, parte da certeza de que a FENED só estará nas universidades, efetivamente, quando os Centros Acadêmicos, coletivos e grupos que acreditam nela como espaço de transformação trouxerem esse compromisso para o seu dia-a-dia.

Para tanto, car@ colega militante de coletivo organizado ou Centro Acadêmico, tome esse compromisso como seu! Construa, de 28 de março a 1º de abril, a I Semana de Lutas da FENED na sua Universidade! Na ação estaremos juntos!


(ii)               Eixos de luta e método sugerido

A CONED, após debates em diversos Conselhos de Centros Acadêmicos e em sincronia com as deliberações da plenária final do XXXI ENED, ocorrido em julho/10 em Brasília, propõe dois eixos centrais para a Semana de Lutas: educação jurídica, focada em estágio; e combate às opressões.

A Semana de Lutas simboliza a possibilidade de os Centros Acadêmicos realizarem atividades levantando a bandeira da Federação e toda sua bagagem de lutas e anseios. Esse ponto de partida, depois do qual poderá e, esperamos, será levantada a bandeira da FENED em diversos outros atos públicos e atividades, significa um primeiro contato dos estudantes locais com as pautas nacionais e mesmo uma expressão da mobilização que se desenha cada vez mais profícua.

Por esse motivo, embora se sustente como principal ponto de ação a Campanha do Estágio, a ser lançada no dia 1º de abril, no encerramento da Semana de Lutas, entendemos que os coletivos e Centros Acadêmicos possuem autonomia para, conforme sua problemática local, priorizarem o debate da Federação que lhes parecer mais dialogável perante sua base.

Como método sugerido, propomos a criação de comitês locais, por universidade ou região, para a organização de oficinas, cine-debates e espaços horizontais de maneira geral de formação e troca, como também atos públicos, panfletagens, passeatas, intervenções, conforme a realidade local. Bem como levar à base os materiais que guiam as várias campanhas temáticas da Federação já em andamento. Abaixo, esmiuçamos minimamente o conteúdo dos eixos deliberados para a Semana de Lutas, no interior do qual poderão trabalhar os comitês locais:


Educação jurídica e estágio

Há alguns anos, a FENED desenvolve estudos e debates em torno da superficialidade da educação jurídica no Brasil. Segundo dados do CNJ, há mais cursos jurídicos no Brasil (ao total, 1.240) do que no resto do mundo somado (ao total, 1.100).

Este modelo de ensino jurídico concerne a uma lógica de mercantilização do saber, segundo a qual o Direito e, em especial, a graduação em Direito não deve nada à sociedade, servindo, antes, aos mais diversos interesses, sobretudo privados, como cursinhos jurídicos voltados a concursos públicos e ao Exame da OAB.
Com baixos índices de pesquisa e extensão – num contexto ideal de IES (Instituições de Ensino Superior) –, com pouquíssima ou inexistente assistência estudantil, o estudante, ao buscar escapar da superficialidade do dia-a-dia em sala de aula, procura no estágio uma forma de complementar seu conhecimento e sua renda. Não raro, aliás, esse complemento se torna o fator essencial, tanto do conhecimento quanto do sustento do estudante.

Ora, é evidentemente problemático que a resposta à superficialidade do ensino jurídico seja dada em um ambiente hierarquizado, que não se compromete com a inserção entre saberes acadêmicos e populares, por meio da extensão, nem permite a liberdade de reflexão e criatividade na busca de soluções para um novo mundo possível, por meio de pesquisa independente.

As condições de exercício e desenvolvimento do estagiário – que, embora exerça uma função de trabalhador sem as garantias do vínculo empregatício, não é reconhecido como tal – são inaceitáveis. O estagiário, não raro, cumpre a função do operador do Direito que ele estaria apenas auxiliando e a partir do qual teria a liberdade de aprendizado e evolução. Trabalha mais tempo, com menos salário, menos férias, menos legitimidade simbólica e transformando o que seria o complemento à sala de aula em fator que desestabiliza sua vida acadêmica e social.

Assim, é necessário que se faça o debate acerca dessa temática, gerando a emancipação dos estudantes acerca de sua condição explorada no estágio e das poucas mas pleiteáveis prerrogativas que lhe cercam, para dar partida à campanha da FENED.


Combate às opressões

Vivemos em uma sociedade que possui diversos muros invisíveis, impostos pelas mais diversas e não desconexas construções sociais. Entre elas, as que colocam o homem branco heterossexual como padrão de normalidade, com o devido recorte de classe, isto é, com a potencialização e ressignificação da opressão aos mais pobres.

Esses muros, obviamente, são reproduzidos pelos cursos jurídicos. O Direito, enquanto instrumento de criação e legitimação das normas que norteiam o senso comum e mantêm o stabilshment, deve ter suas regras e efeitos questionados.

É necessário lutar contra a criminalização das mulheres pobres, que, ao não terem condições de manter seus filhos, culminando na necessidade do aborto, têm seu problema de saúde tratado sob o prisma da punição e do encarceramento.

É necessário lutar contra a criminalização da nossa juventude pobre e negra, evidenciada em prisões superlotadas, cujo maior número de encarcerados lá se encontra por delidos ao patrimônio (furto, roubo).

É necessário lutar contra os olhares, falas, símbolos e atos diminuidores do corpo, das formas de afeto e sexualidade, de homossexuais, bissexuais e transgêneros, cuja identidade e liberdade são constantemente atacados pelos mais retrógrados e inaceitáveis controles do corpo.

Por essas e outras lutas, evidenciando os dados de mulheres que são obrigadas a realizar aborto clandestino no Brasil (cerca de 1 milhão), de gays (o Brasil, segundo o Grupo Gay da Bahia, em pesquisa realizada no ano de 2010, é o país onde mais são assassinados gays no mundo: um a cada dois dias), evidenciando a opressão estatal tornada corriqueira aos pobres e negros (vejam-se os arquétipos predominantes nas penitenciárias brasileiras),  precisamos acercar-se destes problemas, escarafunchá-los, ir à sua raiz, cotejá-los à nossa práxis jurídica, trazê-los às nossas Faculdades e a partir disto construir uma nova sociedade.